Coordenação:
Felipe Benicio (UFAL)
Ildney Cavalcanti (UFAL)
Seja por meio do retorno a uma suposta língua original ou das tentativas de criação de línguas universais, a busca por uma língua perfeita (Eco, 2018) constitui um projeto que ilustra o desejo humano por uma forma de comunicação sem barreiras ou ruídos, demonstrando, assim, que língua e utopia são signos desde sempre entrelaçados. Desde o texto fundador de Thomas More, Utopia (1516), língua e linguagem têm sido instâncias significativas da construção ficcional de utopias e, posteriormente, distopias literárias. Em sua frutífera relação com a ficção científica (Moylan, 1986; Suvin, 1979; 1988), sobretudo a partir do século XX, utopias e distopias recorrentemente ressaltam o elemento linguístico, algo que se dá de muitas formas, seja com a criação de línguas fictícias, como o newspeak em 1984, de George Orwell, ou o láadan em Native Tongue, da escritora e linguista Suzette Haden Elgin; seja com a especulação acerca das transformações linguísticas pelas quais um idioma pode passar, como ocorre com a língua inglesa em Cloud Atlas, de David Mitchell, e Riddley Walker, de Russell Hoban — fenômeno analisado por David Sisk (1997) em The transformations of language in modern dystopias. No caso da ficção distópica, especificamente, o controle da linguagem e dos meios de comunicação representa um fator crucial para a manutenção dos sistemas opressores descritos nessas narrativas (Cavalcanti, 2000; Baccolini; Moylan, 2003; Moylan, 2016). Mas na literatura, como fora dela, a língua é sempre uma arena de disputas, e, justamente por isso, ela também é o instrumento por meio do qual as personagens das distopias constroem suas contranarrativas de resistência, de modo que esses sujeitos ficcionais e o público leitor consigam vislumbrar as utopias (fora) da linguagem (Cavalcanti, 2000). Diante disso, este simpósio tem como objetivo refletir sobre o papel da língua e da linguagem em obras utópicas e distópicas, de diferentes períodos e mídias, de modo a aprofundar a discussão acerca de aspectos teóricos e metodológicos relativos à análise dessas obras em interface com os estudos literários e linguísticos. Se, conforme propõe Peter Stockwell (2000), a apresentação de novos mundos pressupõe a necessidade de novas palavras — como tão bem ilustrado pela seleção de termos provocativos de novas ecologias, muitas vezes oriundos da ficção científica, presentes em An ecotopian lexicon (Schneider-Mayerson; Bellamy, 2019) —, assim como novas formas de compreensão de mundo, novas estruturações sintáticas e articulações semânticas, também serão aceitas reflexões acerca dos impactos formais provenientes da transposição das utopias e distopias (gêneros predominantemente narrativos) a outros formatos e mídias, como poesia, cinema, quadrinhos, jogos virtuais, artes plásticas e música.
Palavras-chave: Utopia, Distopia, Língua, Linguagem.